Biombo Escuro

Estreias da Semana

Triângulo da Tristeza

por Guilherme Salomão

15/02/2023; Foto: Divulgação

A comicidade e a sujeira por trás das hipocrisias da elite 

Após faturar a Palma de Ouro em Cannes com The Square: A Arte da Discórdia (2017), o sueco Ruben Östlund, que, a essa altura do campeonato, cada vez mais estabelece um estilo próprio de suas obras, agora chega aos cinemas com Triângulo da Tristeza- o seu mais novo longa-metragem, que além de mais uma vez ter rendido ao cineasta a honraria máxima no Festival de Cannes em 2022, está indicado em três categorias do Oscar 2023, sendo elas Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Roteiro Original. 

Dividida em três partes, a trama gira em torno do jovem casal formado por Carl (Harris Dickinson) e Yaya (Charlbi Dean), um modelo e uma influenciadora digital, respectivamente, em busca de prestígio no universo da moda e tudo que o envolve. Eles decidem embarcar em um cruzeiro de luxo, onde se vêem cercados por um variado grupo de pessoas da elite social, que vão desde um vendedor de fertilizantes até um fabricante de explosivos. A viagem, porém, acaba tomando um rumo inesperado quando, de forma repentina, um grupo de piratas ataca a embarcação, fazendo com que os sobreviventes fiquem presos em uma ilha deserta. 

Em um primeiríssimo momento, ao nos apresentar ao casal protagonista, Triângulo da Tristeza pode até passar uma leve impressão de ser um comentário ao mundo da moda e aos percalços da profissão de modelo. Entretanto, conforme as interações entre os personagens se desenvolvem e com as respectivas situações as quais Ruben Östlund os sujeita de forma episódica, a sua verdadeira intenção fica nítida de uma forma bem direta e até didática. 

Assim, por meio de uma coleção de diálogos e momentos dos mais peculiares (e até nojentos, no sentido literal da palavra), Östlund, que também assina o roteiro da produção, mira seus esforços criativos em uma sátira aos comportamentos superficiais, hipócritas e alienados da alta sociedade. Ideia essa que, aqui, ganha vida por meio de uma direção metódica do sueco, com movimentos de câmera e enquadramentos milimetricamente calculados que, auxiliados por um bom trabalho de direção de arte, ditam o tom de superficialidade de uma vida cercada de normas e luxos vazios. 

Deixando claro que vivem de aparências, mas não só com relação a profissão, ainda na primeira parcela da projeção, Carl e Yaya, ambos dentro daqueles que são considerados os padrões sociais de beleza, discutem sobre qual dos dois caberia pagar a conta de um jantar. Já na segunda parcela, além da hilária conversa de frases prontas e clichês entre um dos passageiros do iate, um russo defensor ferrenho do capitalismo, com o capitão, um americano alcoólatra de viés Marxista (interpretado pelo excelente Woody Harrelson), o destaque maior é da sequência onde, após o aguardado jantar com o capitão, todos os passageiros, vítimas de seus próprios luxos, começam a passar mal simultaneamente, resultando em um “vomitaço” generalizado- com Östlund apostando sem receios no apelo gráfico, que resulta em uma situação de humor ao mesmo tempo absurda e repulsiva. 

Depois daqui, na derradeira parcela do filme, após a irônica reviravolta da história, em que piratas atacam a embarcação utilizando justamente uma granada (que o passageiro fabricante de granadas discursava orgulhosamente sobre), a aposta de Östlund é em colocar essas figuras se vendo sujeitas a uma inversão de valores que talvez não imaginassem - já que agora estão à mercê de uma camareira que vem a ser a única do grupo com habilidades básicas de sobrevivência. É fato que, desse momento em diante, o filme perde um pouco de ritmo. Entretanto, é nele em que o diretor coroa essa exposição da verdadeira natureza de uma burguesia que vive, de fato, de aparências. 

A sátira de Triângulo da Tristeza pode até ser passível de ser interpretada como superficial ou óbvia em suas mensagens. Nesse contexto, porém, se deixar levar pelo tom tragicômico de seus acontecimentos absurdos talvez seja uma opção mais viável do que a busca por uma profundidade mais incisiva de seus comentários sociais. 

Guilherme Salomão

Redator

Guilherme Salomão é Social Media, Produtor Audiovisual, Colunista e Criador de Conteúdo digital apaixonado por Cinema, Música e Cultura Pop. Administrador por formação, onde foi autor do TCC “O Poder da Marca no Cinema: O Caso Star Wars de George Lucas”, ele também estudou Produção Audiovisual na Academia Internacional de Cinema.