Biombo Escuro

18ª CineOP

A Voz e o Vazio: A Vez de Vassourinha

por Tiago Ribeiro

30/06/2023; Foto: CineOP

Entre trucagens e tragédias

Quando nascia o hip hop, com seus MCs e rappers, estabeleceu-se um método de criação musical a partir de samples, onde através de uma colagem de instrumentações de músicas distintas se formava uma nova música, uma batida diferente. Muito advindo dos breaks usados no funk estadunidense, que começaram com as músicas de James Brown, esses métodos foram adotados de diversas formas por toda sonoridade das décadas seguintes, como no disco e na música eletrônica.

Samplear era um trabalho sujo, através do qual beatmakers acumulavam montantes de discos em busca da melhor forma de combiná-los, em um esforço de ressignificação que exigia destreza na combinação de diferentes instrumentais para formar algo novo. Dessa forma a música evoluiu, da mistura de gêneros e de influências que fizeram nascer as expressões modernas de música.

Nessa esteira, também surgiram os remixadores no cinema. Com um processo de montagem que muitas vezes se assemelhava à colagens, os remixadores embolavam uma miríade de imagens e sons que interagiam de modo a criar as mais diversas imanências sensoriais e processos de significação. É um pouco desse ethos de fazer cinema, e principalmente dessa abordagem em relação à edição, que nascem filmes como A Voz e o Vazio: A Vez de Vassourinha, curta-metragem dirigido por Carlos Adriano que honra a curta vida do músico Vassourinha, uma estrela em ascenção do samba que morreu tragicamente aos 19 anos, na década de 40.

O que mais chama atenção no curta é a montagem, feita pela lendária Cristina Amaral, colaboradora constante nos filmes de Carlos Reichenbach. A montagem conduz o olhar e desafia os sentidos do espectador através de seus samples de recortes de jornais, de fotografias em sépia e dos discos de 78rpm de Vassourinha, gravados pela Columbia Records. O mote é o remix, as imagens giram, e se sequenciam sambando junto ao balanço do cantor, em um processo que cria a impressão de movimento e musicalidade, mesmo se lidando com imagens estáticas. 

Passado o momento em que navegamos pelos registros da vida de Vassourinha e depois que sabemos de sua tragédia, o curtade repente vai para outro lugar, com um câmera na mão tensa, operada por Carlos Reichenbach, que corre por um cemitério em busca de alguma conclusão, achando enfim a lápide do eterno sambista. A montagem ansiosa de Amaral ainda se faz presente, com cortes bruscos nas imagens ansiosas desse momento do filme.

A Voz e o Vazio: A Vez de Vassourinha passeia pelas partituras das canções, reconstituindo a vida e a obra de um grande artista que faleceu cedo demais. Com um trabalho de montagem moderno e aquém do remix feito por Cristina Amaral, repleto de samples e experimentações diversas com arquivos, chama atenção por estarmos lidando com o samba da década de 30, uma combinação inusitada mas bastante fortuita nesse filme musicado e autenticamente experimental de Carlos Adriano.