Biombo Escuro

Estreias da Semana

Pantera Negra: Wakanda Para Sempre

por Guilherme Salomão

09/11/2022; Foto: Divulgação

A necessidade de reconstruir frente a perdas irreparáveis

Criado em 1966 pelo roteirista Stan Lee e pelo desenhista Jack Kirby, não demorou para que o Pantera Negra conquistasse as audiências após fazer sua estreia no Universo Cinematográfico da Marvel em “Capitão América: Guerra Civil (2016)”. Em 2018, o herói, interpretado pelo ator Chadwick Boseman, ganhou sua própria produção, um marco não só do cinema de super-heróis, mas também da indústria como um todo. “Pantera Negra” (2018) foi a primeira grande produção do Marvel Studios protagonizada por um afro-americano, desempenhando, assim, um papel fundamental no que tange a representatividade nas telas. O filme quebrou inúmeros recordes nas bilheterias e em premiações, se tornando, inclusive, o primeiro longa-metragem de heróis a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme em toda a história da premiação.

De potencial comercial (e social) evidente, os planos futuros do Marvel Studios para com o personagem, porém, sofreram um golpe que pegou a todos de surpresa: em agosto de 2020, aos 43 anos, Chadwick Boseman veio a falecer vítima de um câncer de cólon- doença que ele havia mantido em segredo ao longo de todo o tempo em que gravava suas participações no filme focado no super-herói e nas superproduções Vingadores: Guerra Infinita (2018) e Vingadores: Ultimato (2019).

Nesse contexto, após a acertada decisão do produtor Kevin Feige (o grande líder por trás dos filmes do Universo Cinematográfico da Marvel) de não escalar um substituto para Boseman em produções futuras, em Pantera Negra: Wakanda para Sempre, o diretor Ryan Coogler e o roteirista Joe Robert Cole, que aqui repetem a parceria do longa de 2018, partem da árdua missão de suprir, de alguma forma, a ausência do ator, sendo inevitável a reestruturação quase que completa da trama planejada originalmente para a produção.

No filme, após a morte do Rei T'Challa (Chadwick Boseman), sua irmã, Shuri (Letitia Wright), sua mãe, a Rainha Ramonda (Angela Bassett), seu interesse amoroso, Nakya (Lupita Nyong'o), Okoye (Danai Gurira) e as Dora Milage, lutam para proteger e reconstruir a então fragilizada nação de Wakanda. Enfrentando ameaças externas de países interessados no uso do Vibranium, um valioso metal presente em abundância no país africano, o maior desafio de Wakanda será, de toda forma, confrontar uma poderosa nação submersa, liderada pelo rei Namor (Tenoch Huerta).

Dispensando, de início, o humor característico das produções do Marvel Studios, Coogler e Cole focam seus esforços criativos na busca de uma solução para a ausência de Boseman. Assim, os primeiros minutos de filme são inteiramente dedicados a explicação da morte de T’Challa, cuja causa foi uma “doença misteriosa” (que, assim como o ator, o personagem também optou por manter em segredo), e a um consequente funeral, em uma sequência que funciona como um belo tributo ao herói e a seu intérprete.

A ausência da figura de T’Challa, de todo modo, é sentida ao longo de toda a projeção. Há, aqui, a preocupação e a necessidade de restabelecer todas as peças daquele universo e suas respectivas funções. Essa ausência irreparável é, nesse contexto, justamente o que determina as ações dos personagens, sendo exposta a maneira como cada um deles lidou com o luto e a necessidade de resistir e seguir em frente diante dessa tragédia. Em paralelo, encorpando a trama além do drama de seus protagonistas, a inserção de novos personagens também se faz presente para suprir a lacuna deixada pelo protagonismo de Boseman. Além de Namor (que mais funciona como o vilão), há a introdução de Riri Williams, a “Coração de Ferro” (personagem cuja origem, nos quadrinhos, passa pelas mãos do desenhista brasileiro Mike Deodato Jr.), interpretada pela atriz Dominique Thorne.

Assim sendo, diante desse cenário, Ryan Coogler opta por jogar seguro e replicar em Wakanda para Sempre o que fez de seu antecessor bem-sucedido, tanto em relação a sua mise-en-scène, quanto às pautas que demarcaram a trajetória do personagem desde a sua origem nos quadrinhos. Além dos temas latentes de imperialismo e colonialismo, que permeiam todo o roteiro, agora também na origem de Namor, a iconografia marcante do longa de 2018 se faz mais uma vez presente. O bom trabalho do design de produção e figurinos na concepção visual de Wakanda, e a trilha sonora de Ludwig Görranson, que mistura elementos da música pop contemporânea com os da cultura africana, são mais uma vez destaque. Além disso, de tom grandioso e envoltos por uma fotografia calcada em tons azuis esverdeados, também se sobressaem os belos novos visuais para Talocan, o Reino comandado por Namor.

Ao se render a alguns dos vícios e clichês das produções desse gênero, sobretudo no que tange às motivações para as ações de certos personagens, principalmente a introdução de Shuri como a nova Pantera Negra, e a resolução preguiçosa dada ao conflito central estabelecido ao longo das quase três horas de filme, o filme acaba derrapando em si mesmo em sua parcela final de projeção. De todo modo, prevalece em Wakanda para Sempre um tributo consciente a Chadwick Boseman. Ryan Coogler insere a ação de forma pontual e compreende que essa é uma história, acima de tudo, sobre reconstrução, sendo consciente, junto disso, dos momentos certos para homenagens, em que, ao invés de emoções vazias, são despertados gatilhos emocionais certeiros nas audiências.

Wakanda para Sempre pode não ser um filme perfeito, mas é um tributo digno a uma personalidade que, sem dúvidas, marcou a história recente do cinema blockbuster mundial. Chadwick Boseman para sempre!


Guilherme Salomão

Redator

Guilherme Salomão é Social Media, Produtor Audiovisual, Colunista e Criador de Conteúdo digital apaixonado por Cinema, Música e Cultura Pop. Administrador por formação, onde foi autor do TCC “O Poder da Marca no Cinema: O Caso Star Wars de George Lucas”, ele também estudou Produção Audiovisual na Academia Internacional de Cinema.