Biombo Escuro

festival do rio 2021

ENCONTROS

por Alberto A. Mauad

13/12/2021; Foto: Divulgação

Não sei, porém, às vezes, acho interessante pensar em toda mise-en-scene minimalista naturalista de Hong Sang-soo como um impressionismo às avessas. Digo isso, não porque haja essa busca de revelar uma alegria nos deslocamentos do cotidiano, mas sim uma dor latente, que se movimenta e perpassa por todos os cantos de sua película. Captado, principalmente, por um estudo extremo da presença do ator em seus planos formalistas para gerar, assim, um retrato fidedigno de uma crônica.

Portanto, Encontros (2021), revela um ponto de partida, a priori, banal, que gira em torno de três histórias de cronologias diferentes: 1) O reencontro de Youngho (Shin Seok-ho) com o seu pai médico (Kim Young-ho); 2) A mudança de Juwon (Park Mi-so) para a casa de uma pintora (Kim Min-hee) em uma cidade onde estudará moda e, consequentemente, terá que se despedir de sua mãe (Seo Young-hwa); 3) Uma refeição entre Youngho, sua mãe (Cho Yun-hee), seu amigo Jeongsoo (Ha Seong-guk) e um ator famoso (Ki Joo-bong).

A primeira questão a ser apontada é a da incomunicabilidade geracional, majoritariamente entre pais e filhos. É engraçado como em cada conto há, pelo menos, três personagens, onde um deles está na balança entre o indivíduo mais velho e o mais novo. Em determinado momento, por exemplo, percebe-se como Juwon se sente acuada e tímida por não saber responder todas as perguntas realizadas por Kim Min-hee acerca de seus aprendizados. Contudo, é justamente a pintora que servirá de moderadora na relação entre mãe e filha quando o trio está conversando sobre o namorado de Park Mi-so.

Todavia, ao mesmo tempo que o filme fica reafirmando essa distância, ele também nos testemunha uma constante intimidade sutil, que é inerentemente natural e estranha. Como em uma das sequências finais, onde Youngho e seu amigo avistam Cho Yun-hee da varanda do hotel e, no entanto, não decidem acenar para ela, pois, assim, não atrapalhariam essa contemplação da mãe.

Assim sendo, visualizamos que na cinematografia de Hong Sang-soo, um gesto gentil, preciso e suave, sempre auxiliado por uma harmoniosa agitação da câmera, têm tanto – ou até mais – a sugerir do que um diálogo. E é exatamente isso que compõem o seu cinema, esse poder sugestivo. Seja em um abraço de reencontro; na tentativa falha e graciosa da filha em ajudar a Seo Young-hwa em acender um cigarro; ou no zoom in da mãe refletindo na sacada.

Portanto, eu diria que, toda essa dor latente, advinda gradualmente de um afastamento íntimo, da sua reaproximação, da presença de um medo de um sonho difícil e de uma saudade de um tempo que nunca retornará, se materializa, concretamente, em um dos últimos planos da obra, onde o protagonista sai daquele mar gelado e não consegue conter o frio. Dado que, é aí que percebemos a residência do maior estímulo do diretor coreano, derivado de uma representação em que cada singeleza possui um sentimento demasiadamente profundo e agonizante. É o sofrimento inacabável inserido em cada pequena atitude, seguido continuamente de um zoom que nenhum outro autor de cinema consegue aplicar de maneira tão instigante quanto Hong Sang-soo.


    Alberto A. Mauad

    Redator

    Estudante de cinema na PUC-Rio, redator do Biombo Escuro e cineasta. Tem interesse pelas áreas de linguagem, história e autorismo cinematográfico.